quinta-feira, 19 de abril de 2018

1931 – Coral de Tóquio (Yasujiro Ozu, Japão) **** (4.0)


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Este é um filme da primeira safra de Ozu, no cinema mudo. Ainda com sua estética em formação, percebe-se bem a influência do cinema americano, mais precisamente o estilo de Lubistch. Sendo assim, conta a história de Shinji que trabalha numa companhia de seguros e luta para cuidar de sua família.
            
A primeira coisa que se deve dizer deste Ozu é que diferente do que Metz comentava sobre o cinema mudo, aqui as expressões não clamam pelas palavras, não existe um exagero do gesto que se classifica pelo linguista como uma dificuldade de expressar-se sem as palavras. Existe uma sutileza que irá perdurar pelo resto de todos os filmes do diretor. Assim, a atuação de Tokihiko Okada como Shinji vai da calmaria à contemplação, ao estresse das injustiças sociais e cotidianas, ao desespero de ter feito algo que ninguém faria. Aliás, todo o elenco faz um belo trabalho.
            
A história se inicia com Shinji mais jovem, quando um rigoroso professor faz os alunos ficarem em formação na parte de fora da escola. Ele surge aí quase como um delinquente, por não conseguir cumprir com as ordens necessárias. Quando deixa a fila para trás, senta no chão e observa a natureza, o vento, as árvores. Então, uma elipse avança a narrativa em sete anos e aí que percebemos certa infelicidade e complacência do protagonista em seu trabalho, ouvindo o desejo dos filhos de ganharem certos presentes, tentando ao máximo ser homem que todos querem que ele seja. Ao mesmo tempo que é de certo triste estar nessa posição, Ozu, por vezes faz ação decorrer com um tom burlesco cômico, dentro de pequenas situações de escritório.
            
O enredo ganha contornos quando todos estão esperando receber o bônus salarial, porém o funcionário mais velho da empresa acaba por ser demitido. Nesse momento compreende-se o motivo da primeira cena, de Shinji jovem. Pois aqui ele produz o ato de rebeldia que muda o curso de sua história, ele vai de encontro com seu chefe por conta de tal ação e acaba sendo demitido. É aí que o protagonista da história começar a permanecer muito em casa e a procurar emprego atrás de emprego para sobreviver.
            
Em sua casa, Ozu, usa aqui dos conhecidos “plano tatame”, no qual a câmera se posiciona bem baixa e não como num contra-plongee, mas em seus noventa graus padrão. Enquadrando assim seus personagens mais ao longe, obtendo uma visão que muitos chamariam de puramente japonesa, já que culturalmente é dessa perspectiva que se observa as cenas nesse país oriental. É possível ter uma visão mais intimista da vida tradicional japonesa assim. Já no trabalho, é utilizado bastante travellings que produzem a sensação de uma velocidade maior nos acontecimentos, além dos enquadramentos serem propriamente ditos os planos americanos.
            
O diretor também usa de signos temporais simples para indicar a passagem de tempo e da cultura japonesa, por vezes as roupas estendidas no varal, ou alguma casa com seus contornos orientais conseguem chamar a atenção para todo o contexto social do qual se fala. Esses planos, que posteriormente se desenvolveriam deveras na obra do diretor, aqui aparecem em seu estado protótipo, sendo usados principalmente como transição e passagens temporais, além de pontuarem as cenas com um sabor de cotidiano. Ozu tem uma compreensão muito grande da imagem, muito afrente de seu tempo. Existe desde esse filme uma tridimensionalidade da imagem, algo que era possível ver no Renoir dos anos 30 também.
            
Alguns o chamam de formalista pela rigidez que estaria por desenvolver a partir da elaboração maior em cima destas sutis técnicas que aparecem de forma embrionária aqui. Porém, o diretor também é conhecido pela sua humanidade e sutileza, é nesse ponto que seus filmes crescem ainda mais. É no reencontro, é no canto em coral daqueles que se ajudam na necessidade, nos momentos mais difíceis que se encontra a potência do estilo de Ozu.
            
Portanto, este foi meu primeiro filme de Yasujiro Ozu, um filme que consegue ser cômico e dramático com muita simplicidade, além de obter tudo isso no cinema mudo sem necessitar de uma expressividade exagerada (comum ao expressionismo por exemplo). A poesia do diretor se encontra nos espaços vazios que constroem ao redor de seus acontecimentos, não só com o efeito contemplativos, mas principalmente afetivos.

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