
Esse
é o centésimo filme de Miike, que está sempre extrapolando os limites dos
gêneros e o conceito próprio de comercial. Já tendo adaptado uma série de
mangás, essa nova obra é mais um bom filme de samurai, porém com um toque
sobrenatural (que “13 Assassinos” havia dado margem) em sua extrapolação
máxima. Adaptando o mangá chamado de Blade of The Immortal, contando a história
de Manji, um samurai que se tornou imortal, sendo está sua sina.
Existe um prólogo narrativo, em
preto e branco, que serve como base para os principais motivos de seu enredo. É
o momento em que Manji perde sua irmã, assassinada, e se torna amaldiçoado para
sempre com a imortalidade. Aqui já se percebe qual será o tom de seu longa,
unindo o gore do qual habitualmente se tornou conhecido com as narrativas
existenciais dos samurais. Esse ato se encerra com a descoberta da imortalidade
e por isso existe a transição para as cores, construindo uma distinção forte
entre quem foi esse personagem antes e depois da maldição.
Bem, o enredo, de fato, se inicia
com a presença de Rin, uma jovem que pede ajuda a Manji para vingar seu pai. O
mote simbólico se instala, pois Hana Sugisaki interpreta tanto Rin quanto a
irmã de Manji, o que o torna afetivamente implicado na vingança da mesma. Não
só para passar mais momentos com suposta presença fantasmagórica de sua irmã,
mas também encontrar um motivo para ainda estar vivo. Pois o grande peso
existencial do samurai foi ter se tornado imortal quando a única coisa que lhe
importava havia deixado de existir. Quem assassinou a família da jovem foi
Anotsu, um homem impiedoso que tem como aliado uma trupe imensa de assassinos
misteriosos, tendo como principal intenção a de dominar todos os clãs de
samurais. Com isso, a grande função de Manji é vingar, não os pais de Rin, mas
vingar os desejos destruídos de sua irmã.
Quando os pontos de intriga
narrativos se estabelecem, Miike acelera sua narrativa, fazendo seu
protagonista enfrentar um inimigo após o outro. Não há tempo a perder. Pode-se
questionar essa escolha em relação a adaptação, já que por conta da velocidade
muito coisa deve ter ficado de fora, porém é impressionante como, ainda assim,
persiste uma força narrativa que torna as ações interessantes e com impacto, ou
seja, a velocidade não atrapalha o desenvolvimento dos personagens principais e
nem torna seu enredo inócuo. Porém, isso não quer dizer que o filme é pequeno,
ou que parece que tudo acontece muito rápido, o enredo é longo e o diretor
explora o tempo de cada luta de maneira concisa e impactante para o
desenvolvimento de seus personagens.
A fotografia aliada do design de
produção constrói facilmente a época dos samurais em tela, além de dar uma
ênfase nas cores das vestimentas e não necessariamente pela significação
possível de cada uma delas, mas sim por se destacarem no meio da sujeira, do
sangue e da terra. A maquiagem e os efeitos digitais são extremamente bem
realizados, as cicatrizes do corpo do Manji e a própria elaboração de cada um
dos vilões, por mais caricatos e espalhafatosos que alguns sejam, conseguem se
tornar algo cheio de relevo e força. Os efeitos digitais são usados
principalmente para demonstrar a imortalidade do protagonista, que mesmo com o
corpo desmembrado sua maldição, que parece um verme em seu corpo, faz seus
pedaços se reconstituírem para que ele continue perseverando, explorando nesses
momentos o gore que não surge como jogado, mas como necessário para perceber
todas as feridas abertas desse personagem.
Mesmo com a possibilidades dos
efeitos digitais, as lutas são realizadas com um primor e um peso real. Elas
não são necessariamente longos, mas são carregadas de um peso do próprio
personagem, com seu corpo caindo aos pedaços diversos momentos, desafiando os
limites a todo momento do corpo humano. Dizer isso não é negar que grande parte
da violência e das próprias lutas tenham todo um estilo inverossímil, afinal,
Manji faz brotar espadas atrás de espadas, mas são esses detalhes supostamente
falsos que criam um sabor simbólico da fantasia. O samurai imortal que carrega
incontáveis espadas. Miike monta essas sequências com habilidade, sem torná-las
confusas com o corte, muitas vezes até focando no close-up de seu protagonista.
Impondo ritmo com o movimento de câmera, não chega a ser o tremor de Bourne,
mas é um movimento mais calculado para criar intensidade.
Miike já produziu muitos filmes
ruins e alguns bons, ele é um diretor que se diverte com o que faz. Quando
Manji enfrenta Anotsu, os corpos no chão, o sangue fazendo os pés deslizarem, o
cambalear dos sujeitos que lutam até o último fiapo de vida, é nesse momento
que se percebe a força que Miike ainda tem como um cineasta.
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