quinta-feira, 12 de abril de 2018

2018 – Um Lugar Silencioso (John Krasinski, EUA) **** (4.0)


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Nesses últimos anos o gênero de terror vem sendo levado a sério por uma parcela de artistas interessantes no cinema. Quando digo sério não é de forma literal, mas sim que vendo sendo explorado a partir de questões culturais e do espírito de época e, principalmente, experimentando diversas de suas potencialidades. Um Lugar Silencioso surge como uma verdadeira experimentação de design de som, criando texturas no silêncio e ritmo com as variações musicais.
            
Em primeiro momento, o longa apresenta as regras do universo no qual se insere. O mundo como conhecemos agora é outro, todos que ainda vivem cultivam o silêncio, pois criaturas inomináveis tomaram conta do planeta e elas capturam suas presas a partir do som que emitem. Magistralmente a montagem e o design de som são cadenciados de forma que já demonstre o incômodo que é para o ser humano permanecer em silêncio por tanto tampo, vivenciar o silêncio, pois o entendemos como uma pausa no fluxo da fala, um corte, ou seja, sentimentos o silêncio como uma mordaça simbólica de nossa expressividade. Logo, nesse seu “prólogo”, consegue-se adentrar de forma imersiva nesse processo de seus personagens.
            
Krasinski, ao escrever o roteiro e dirigir, parece ter se influenciado fortemente no período de gravidez de sua esposa, fortificando um sentido até mesmo instintual de família. Os personagens desse longa são uma família entre eles, Lee, interpretado pelo próprio diretor, com uma intensidade e ternura no olhar, algo pouco visto em suas atuações; Evelyn, interpretada pela esposa real de Krasinski, a geniosa Emily Blunt que com certeza é a atriz mais exigida aqui, adentrando em situações complexas na qual precisa explorar o máximo de construção de tensão pelo seu rosto; entre as crianças temos três Regan, a mais velha interpretada por Millicent Simmonds,  Marcus , interpretado por Noah Jupe e por fim, Beau, interpretado pelo novato Cade Woodward.
            
Como eu ia dizendo, o instinto de família parece crescer nesse mundo adverso. Muito já se foi desconstruído em relação a formação cultural, histórica e econômica da família como instituição social, porém é sempre bom lembrar de como alguns animais institivamente protegem seus familiares. O ser humano quando em condições das mais absurdas, em certo ponto, pela impulsividade e intensidade do momento pode expressar o mesmo instinto que os animais. Lee, por exemplo, construiu mecanismos para que pudessem viver em paz, mesmo com a presença dos monstros, seja o uso da areia grossa e fofa em diversos percursos para que seus pés não façam barulho, ou ainda, a tentativa de produzir cômodos com isolamento acústicos em sua casa. Um detalhamento obsessivo e necessário para sobrevivência.
            
A personagem mais intensificada com certeza é Evelyn. Ela está grávida e contém um senso de proteção forte, fazendo suas mesmas análises de seu corpo para manter-se atenta ao processo de gravidez, além de sua preocupação constante com seus outros filhos. Ela parece retirar energia e força de todos os lugares para a sobrevivência. Cabe salientar aqui a especificidade de Regan, pois a personagem e a atriz são surdas, o que talvez tenha facilitado a família a desenvolver uma comunicação sem a voz, já que todos sabem a linguagem dos sinais. 
            
O design de som, como já havia dito, é cheio de relevo. Quando focado na experiência de Regan, nenhum som é reproduzido devido a sua surdez, algo que por vezes acaba por torná-la mais vulnerável já que não sabe quando os monstros estão chegando, ou se ela está produzindo algum barulho. No geral, o silêncio conduz a narrativa, mesmo que exista muitas vezes uma trilha sonora baixa ao fundo, que por vezes antecipa alguns sentimentos. A genialidade do som se encontra em variar entre o silêncio total e o mínimo de barulho, que pela expressividade das atuações e pelo acréscimo de uma trilha que estende o terror, se tornam verdadeiras peças de causar medo. Estando muito além do susto habitual, que é quase sempre premeditado, ou repetitivo.

É possível dizer que aqui não existe esse repetitivo. A narrativa elaborada por Krasinski, em seu enredo, carrega um ritmo veloz, que urge a apreensão do espectador. Sua direção por sua vez é delicada e detalhista, com muitos planos abertos e explorando muito a relação de seus personagens com o meio. Além de saber produzir mistério com o monstro, mesmo que em determinado momento ele apareça até em excesso, mas a situação de urgência é tamanha que o medo não é mais a do desconhecido, é muito mais o suspense de saber se haverá ou não escape da situação. O design do monstro é algo digno de nota, um uso ótimo de efeitos visuais, elaborando uma criatura bizarra e nojenta (por mais pouco inovadora que seja), ainda tendo sua própria sonoridade, que ecoa sempre quando está perto.

Talvez próximo ao seu fim exista algumas escolhas de Krasinski que resolvem a história de forma que destoa um pouco do que foi apresentado, mas que não atrapalham em nada a veracidade das emoções e sensações que o filme consegue produzir no espectador.

Portanto, Um Lugar Silencioso implica o espectador do gênero de terror em explorar o som de maneira distinta, ou melhor, extraordinária. Criando personagens fortes e extremamente conectáveis, com atuações poderosas e uma consistência impressionante na condução do enredo por parte de seu diretor.

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