terça-feira, 14 de novembro de 2017

1977 – O Homem que Amava as Mulheres (François Truffaut, França) **** (4.0)

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Um manifesto sobre o próprio amor do diretor pelas mulheres em suas narrativas. Uma poesia divertida, que brinca com o movimento das pernas das mulheres, como o próprio balanço do mundo. Este filme despretensioso carrega muitos dos signos do diretor em seu estilo mais cômico, ao mesmo tempo que extremamente pessoal. Narrando a história de Bertrand, a partir de seu funeral, onde é visitado por centenas de mulheres.
            
Truffaut não tenta produzir uma explicação plausível de qual a importância deste homem na vida de todas essas mulheres, sua justificativa se encontra na base do todo o filme, o amor irremediável à todas as mulheres. Bertrand encontrava maneiras de apreciar todas elas, um amor que se adaptando aos tempos atuais é levemente assustador. Por exemplo, logo no início do filme quando observa uma mulher de relance, anota sua placa e bate o próprio carro para conseguir encontrá-la. Como essa fosse sua sina, perseguir as mulheres por qual se apaixona, não necessariamente transar com ela, não necessariamente acopla-se a ela. Mas a conversa era o principal, a apreciação aproximada que ele necessitava fazer. Claro, que muitas vezes esses encontros terminavam em sexo, Bertrand era um romântico clássico, um homem das palavras e extremamente eloquente. A narrativa se aprofunda no personagem no momento que ele decide escrever sobre sua própria história. Algo que no Ciclo de Antoine Doinel o diretor pincelou, aqui se torna a própria base de todo o enredo, e não é isso mesmo que Truffaut sempre fez? Aprofundou-se em si mesmo para produzir seus filmes, inspirando-se em outros, mas sempre falando de si. Todos os seus filmes são sua própria história.
            
Este longa tem uma forte impressão sobre a importância da memória para o diretor. Existem breves momentos onde flashbacks ocorrem, usando do preto e branco, parece fazer ressurgir a estética de seu primeiro longa “Os Incompreendidos”, assim como na cena do sonho de “A Noite Americana”. Esses momentos são curtos, mas parecem compreender toda a psicologia de seu personagem, é como se o diretor estivesse buscando momentos que pudessem descrever o desenvolvimento de sua personalidade. Portanto, a relação com a mãe era difícil, porém com uma grande apreciação, pois ela era uma amante dos homens, escrevia sobre todos eles, se encontrava com diversos. Antes de enquadrar esta relação num circuito edipiano, parece traçar muito mais um movimento de repetição e não de busca de uma mãe ideal em outras mulheres. Então, com isto, existe um personagem-autor, pois há uma indiscernibilidade entre o próprio diretor e Bertrand.
            
A estrutura do filme é levemente episódica passeando de mulher em mulher, conduzida fortemente pelo voice-over do personagem. O que torna o longa um verdadeiro compilado de acontecimentos divertidos, por vezes tensos, por vezes leves. Sempre com comentários ácidos e poéticos sobre as mulheres com quem se encontrou e principalmente sobre si mesmo. Esta potência autoral de seus personagens, por vezes se configura numa potência de um cientista/médico, eles urgem a habilidade de invenção. A estética de Truffaut é a do personagem-autor, mesmo ele não sendo um artista, um profissional, todos eles têm essa habilidade de ser o que são e se expressarem em suas próprias linguagem sobre o mundo.
            
Este filme é Truffaut inspirado por sua própria vida, cada vez mais se mostrando obcecado pelo passado, algo que viria surgir de maneira mais intensa e até assustadora em seus subsequentes filmes. Expressando aqui seu amor por mulheres que já era bem notório em todos os seus filmes, dessa forma encerro com uma bela frase de seu personagem “ As pernas das mulheres são como o compasso, que circula o globo o terrestre em todos os sentidos, dando a ele seu equilíbrio e sua harmonia”

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