domingo, 5 de novembro de 2017

2017 – A Vigilante do Amanhã (Rupert Sanders, EUA & Japão) **1/2 (2.5)

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A adaptação em Live-Action americana de Ghost In the Shell parecia acertar em seus trailers, principalmente, por que algumas cenas simplesmente mimetizavam a animação japonesa dos anos 90. Porém, trocando o minimalismo de Oshii pelo maximalismo de Sanders, que não só usa uma estética mais próxima de Blade Runner que de sua obra fonte, como também faz muitas modificações no enredo, enfraquecendo sua história ao ponto de torna-la frágil. Partindo do mesmo ponto, Major, aqui interpretada por uma até esforçada Scarlett Johasen, é uma policial androide que entra numa labiríntica missão de encontrar um hacker que está cometendo crimes e desafiando a ética entre o ser humano e a tecnologia.
            
A princípio, o visual impressiona. Hologramas maiores que os prédios, já descrevendo o poder abusivo que as propagandas contêm, o cinza e as cores coexistindo como se uma não afetasse a outra, assim como o visual das pessoas, num exagero icônico da autenticidade, como se houvesse cada vez mais uma necessidade ser “original”. Porém, em diversas cenas parece faltar relevo, falta imergir o espectador neste universo, já que até mesmo construiu mais nuances que a animação deste contexto futurista. O que acontece é uma plasticidade geral do cenário, que de longe é belo, mas de perto se desconstrói. Até mesmo as cenas de ação com efeitos visuais que exageram na câmera lenta, tornando sempre petrificada as reações de seus personagens. A escolha dos atores – sem ainda comentar sobre o whitewashing* (embraquecimento de personagens e de história de outras etnias) – foi até boa. Scarlett apesar de fazer uma personagem praticamente inexpressiva, ainda consegue deixa-la mais humana, mas quem rouba a cena mesmo é o Takeshi Kitano, realizando o chefe de operações, ganhando mais importância nesta adaptação que na narrativa original.
            
Talvez seja cabível tratar as diferenças deste filme para com o original. Identificando-as e procurando traçar qual o motivo das mudanças. Pois, acredito, que qualquer adaptação não é uma mera cópia da obra fonte, sempre há o peso de quem a produz (digo isto tanto de adaptações de mídias diferente quanto remakes, reboots e as manias do cinema contemporâneo). Mas espera-se que exista um motivo de produção para estas mudanças e que não sejam puramente mercadológicas, em Vigilante do Amanhã ainda mais, por conta de ser um filme bem mais longo que animação original, o que implica em dizer que não só mudaram algumas coisas como também acrescentaram diversos enredos. Para tornar Major ainda mais humana houve a inserção de uma nova personagem, interpretada por Juliette Binoche, como a própria criadora da androide. Até certo ponto é interessante, um dos grandes entraves de Major na animação é parecer mais robô que humana, ou na verdade existir dificuldade de gerar empatia por ela, aqui é o contrário parece ser mais humana que robô, porém a zona de indiscernibilidade do ser humano e da tecnologia que é tão poderosa se perde, este conceito tenta ser construída a partir de seu parceiro, Batou, interpretado até de forma simpática por Pilou Asbaek, que durante uma missão tem que mesclar seu corpo à tecnologia. No original, desde o começo o personagem já possuí pedaços de seu corpo tecnológica e outro personagem faz o humano do grupo.

O ponto principal da adaptação está muito mais em fazer o espectador construir empatia pelas personagens que produzir tais críticas e causar o medo de não saber o que significa ser humano em um mundo onde parece que ninguém mais o é. Dessa forma, encontra-se algo de frágil, se a potência gerada pela sombra da decadência humana era um dos pontos altos do longa original, nesta adaptação não existe, as discussões éticas sobre o que separa o humano de um robô e o medo causado pela dúvida se tornam segundo plano para a mera produção de identificação para com a personagem principal.
            
Os outros dois pontos mais irruptivos da mudança são a presença física de seu vilão, algo que o tornou menos assustador, já que a sua própria comunicação ubíqua era como se ele fosse um ser sobrenatural, o tornavam mais desconhecido, além de seu enredo ser mistura de diversas histórias do universo de Ghost in The Shell. Michael Pitt o interpreta, porém, o personagem se destrói aos poucos, já que ele é estranhamente humano. Com estas pequenas mudanças, percebe-se a mudança de abordagem da mesma história, entretanto, a mudança mais forte em prol de construir empatia foi construírem um passado objetivo e extremamente explícito para Major, descaracterizando-a de forma extrema. É aí que o whitewashing reside de fato. Major era Makoto uma garota japonesa que teve seu consciente (ou suas conexões neurais) transmitidas para um corpo sintético, um corpo americano. Portanto, o whitewashing é inserido como um acontecimento no próprio enredo.
            
Dessa forma, é possível dizer que as mudanças enfraqueceram a potência da história original, a dúvida e a melancolia em relação ao futuro, porém atingem o suposto empático que o diretor buscava. Como se ele buscasse a empatia como resposta, assim como a memória que é utilizada em diversos momentos. Infelizmente (ou felizmente) este filme viverá na sombra de uma obra maior que é a animação, não só por conta do whitewashing, mas pelas suas qualidades gerais também, ele acaba sendo apenas fraco. 

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