
Hana e Alice é um filme
divertido, brincando com a inocência juvenil e as durezas do amadurecimento.
Passeia com suas personagens quase que sem propósito, tendo seu ponto de
partida o momento que Hana, uma jovem garota inusitada, ao ver Miyamoto bater
sua cabeça, inventa que ele está com amnésia e que ela é sua namorada.
Talvez uma das grandes singularidades do cinema de Shunji
Iwai é nos fazer acompanhar seus personagens sem muito julgamento, diversos
momentos são de puro idílio moderno. Dessa forma, com o aspecto da câmera
digital, muito comum nos filmes da virada do século, principalmente no Japão, o
diretor produz certa proximidade visual, além de uma sensação de realismo,
porém consegue utiliza-lo de maneira onírica diversas vezes. Assim, muitas
vezes os passeios se tornam o que sempre devem ser, devaneios, sem objetivos
específicos. Outra boa realização estética do diretor, é o seu posicionamento
de câmera que consegue exibir uma grande noção espacial ao espectador, assim
utilizando de todo o espaço enquadrado para criar movimentos e sensações. As
suas personagens são tão singelas, estranhas e bonitas, uma ingenuidade pura,
uma vivacidade interessantíssima, que conseguem construir um tom cômico muito
especial ao filme, o passar do tempo se torna cativante. A divertida tentativa
de ludibriar Miyamoto de Hana, passa, inicialmente por um tempo de dúvida, mas
logo ele passa a acreditar completamente nesta narrativa inventada. Ela é
obrigada a dizer que Alice, uma grande amiga dela, era a ex-namorada dele, o
que acaba por gerar um triangulo amoroso que desafia a amizade das duas.
Uma questão instigante que surge dessa brincadeira de
Hana é de que se o amor pode ser completamente falsificado, no caso do filme,
aparentemente sim, pois com algumas poucas palavras fez surgir na mente de
Miyamoto uma paixão incrível por Alice, na qual até mesmo histórias falsas se
tornam verdadeiras memórias afetuosas. Neste ponto narrativo, onde uma mentira
afeta outras verdades, as duas amigas se distanciam e se aproximam, se
desafiam. Adentrando na singularidade das duas, conhecendo vagamente a triste
história das duas meninas e o que forma o elo de amizade das duas. Em uma
destas incursões, existe um dos momentos mais belos do filme, se não o mais
belo, quando sabemos que a vontade de Alice é se tornar uma atriz, ou pelo
menos uma modelo. Num determinado momento, em que realiza uma de seus diversos
testes, ela busca algo de próprio para mostrar, assim artesanalmente constrói
uma sapatilha, com copos e fitas adesivas, e dança o balé. Uma sequência que
carrega grande emoção, acompanhada de uma música clássica, com ênfase no piano.
Essa dança, em seus movimentos elaborados, parece dizer muito da amizade das
duas garotas, já que uma das ações que as unem é o balé. Por meio, de pequenos
gestos, descobre-se o quanto as duas ajudaram uma a outra no passado a
superarem várias dificuldades.
Com isto, antes de uma comédia ou um testamento sobre as
mentiras que se tornam verdade, o filme é sobre a amizade de duas garotas,
vivenciado um conturbado período de amadurecimento. Talvez ainda mais simples é
sobre o passeio, o devaneio, as minúcias de uma relação. Iwai enquadra com
tanto amor seus personagens que é impossível não produzir nenhuma empatia por
eles.
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