sábado, 19 de agosto de 2017

1979 – Os Filhos do Medo (David Cronenberg, Canadá) **** (4.0)

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Um indigesto filme sobre ódio de Cronenberg, que toca no ambiente edipiano de uma forma pesada e forte. Conseguindo construir um bom drama, aliado de um terror trash para expressar os horrores de um divórcio. Narrando a história de Frank, um homem que está desesperado, pois sua ex-mulher, Nola, está com a saúde mental fragilizada e ele teme que isso afete a vida de sua pequena filha.
            
Ao iniciar o filme com a cena de uma peça de teatro, que também serve como experimento psicológico/terapêutico, percebe-se muito bem que o diretor pretende trabalhar com a angústia de seus personagens. Sua mulher que, de início, parece sofrer de uma doença somática, fazendo surgir marcas em seu corpo. Nola ainda é dependente de seu terapeuta que trabalha com um estilo teatral e performático, no qual o protagonista assiste no início do filme. Sendo assim introduzido a ideia do Psicoplasma, um tratamento que faz as feridas no corpo aparecerem em consequência da raiva, servindo como forma de dissipar a dor psicologia em dor física. Mais uma vez Cronenberg não foge de sua temática primeira, relação da mente e do corpo, talvez mais precisamente como sua conexão consegue afetar um e outro por meios diferentes. Neste enredo, existe um uso de cores vívidas, muito próprias dos anos 70, os papéis de parede das casas são de cores leves e calmas, mas ao mesmo tempo brilham, assim como no momento em que Frank vai ao legista e uma luz roxa (o roxo no cinema é muitas vezes usado para retratar a morte) explode no ambiente, ressaltando a cor como potencial sensorial. A montagem em certos momentos acelerada parece surgir para não mostrar certas falhas na produção de cenas de ação, ao mesmo tempo que se fazem no gênero do trash, no qual grande parte dos filmes iniciais do diretor parecem viver num limiar. Não só pelo seu gosto pelo grotesco que é imensamente explorado (com certeza com menos precisão) no cenário do horror trash.
            
Os Filhos do Medo se torna realmente interessante com o primeiro assassinato que ocorre. Uma criança de rosto desfigurado e andar desengonçado mata a sogra de Frank, que a protegia. Este primeiro assassinato serve para diversos personagens se movimentem em busca de um entendimento do que está acontecendo com Nola. Aí que o Psicoplasma se revela de fato, a dor, o medo, o ódio, todos os afetos que em sua forma psíquica já são praticamente insuportáveis incidem sobre o corpo até que esse também não o suportem, o levando ao limite, fazendo que ele expulse esse sentimento. Dessa forma, o corpo dá vida a criaturas estranhas, que falam sobre os desejos mais profundos gerados pelos afetos desnorteados e incontroláveis do ser humano. O terapeuta é um experimentador, transformou a experiência da dor de sua paciente em um experimento dos mais terríveis. Ele deu forma material à dor física que um dia fora mental, tornando Nola alucinada. Tendo isso em vista, quando a mente e o corpo chegam em seu limite, neste filme, existe uma produção de realidade material que carrega todo o subjetivo já completamente degenerado de sua personagem.
            
Cronenberg encerra seu filme de forma assustadora e grotesca. Revelando todo o verdadeiro processo do psicoplasma. Construindo, assim, um filme de terror que perpassa diversas questões intensas sobre a maneira que o corpo e mente se relacionam, e de forma mais assustadora de como o desejo sempre é louco e irrepreensível. Em certo, momento chega-se à conclusão que Cronenberg tem medo da liberdade do inconsciente, por isso sempre dirige seus filmes com este pavor e com sua estética grotesca, mas é bem verdade que ela parece assustadora. 

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