
Adaptando a obra máxima de
Mirbeau, Renoir, encontra um misto de realismo e plástico, uma mistura de sua
técnica apurada com a ambientação de estúdio. Tendo a Paulette Godard como a
musa Celestine, sendo a camareira que é contratada pela família Lanlaire.
Um de seus temas mais recorrentes faz-se presente com
força neste drama cômico, a força do embate entre burgueses e proletários. Já
que se aprofunda na relação que os nobres da região constroem com Celestine,
além de é claro como os olhos recaem sobre ela. Como uma presa. Nestas relações
é possível perceber os burgueses da época em suas obsessões individualistas
procurarem certa superioridade, enquanto ela apenas assiste e aprende, apesar
de ter uma válvula de escape com sua companheira de trabalho. O enredo ganha
uma energia mais dramática com a chegada de George, o filho da família, que há
tempos não aparecia em casa. Taxado como um homem doente e com uma dificuldade
grande em construir relações, sua mãe tenta usar de Celestine para deixá-lo em
casa. Neste momento passa a tratá-la bem, tão quanto suas peças de prata.
Objetos e sujeitos são a mesma coisa para a família Lanlaire, contanto que
tenham utilidade.
Além disso, Renoir usa de forma bastante interessante sua
habilidade de profundidade de campo. Em seus filmes, as janelas ao fundo,
abertas, conseguem criar um aspecto de que o microcosmo do enredo não fecha em
si mesmo, sempre está em aberto, em relação com o fora. Enquanto toda a vila
comemora a proclamação da República com um grande Carnaval nas ruas, os
burgueses bebem em sua privacidade, fecham as janelas e ainda comemoram a morte
da República, conseguindo, por meio deste ato da janela, criar uma oposição do
que está dentro e do que está fora. Os momentos que se desenrolam no Carnaval
são sensacionais, um belíssimo uso das multidões, é como se elas ganhassem
vida, lembrando vagamente os filmes do russo Eisenstein.
Os movimentos de câmera são muito bem utilizados também,
movendo-se de um ambiente a outro, com deveras maestria, acompanhando seus
personagens numa vontade moderna. É nestes movimentos que seus personagens se
tornam vivos, que sua relação com o ambiente se torna sensorial, sem eles a
plasticidade do cenário iria vencer o realismo de sua decupação
cinematográfica. Talvez o que falte ao longa seja uma precisão melhor de seu
enredo, se é uma comédia, ou se é um drama, pois sua conjunção faz de certo
modo o longa perder sua graça, ao mesmo tempo tornar seu drama pouco potente.
Próximo do fim, pelo menos, o drama retorna com força e é neste momento
narrativo que todas as habilidades técnicas e de conteúdo do diretor se unem
formando uma conjunção de aspectos sociais, cômicos e filosóficos.
Paulette Godard está simpática como Celestine, por mais
que os diálogos do longa tornem a sua expressividade muito autoexplicativa,
deixando pouco espaço a sugestão. Mas a técnica poética do diretor vive, pulsa,
nos movimentos, na profundidade de campo, esses signos visuais constroem um
ritmo misterioso ao longa, por mais que simples, tornam o longa realmente
divertido e impulsionam a discussão da luta de classe e até mesmo do amor.
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