terça-feira, 30 de janeiro de 2018

2017 – Ao Cair da Noite (Trey Edwards Shultz, EUA) **** (4.0)


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Ao Cair da Noite é um filme de terror que tem como principal intuito trabalhar o medo do desconhecido, por isso, ele entrega pouquíssimas informações sobre o que está acontecendo com o mundo. Com uma montagem que prioriza planos longos, narra a história de uma família que vive confinada em sua casa na floresta, com medo de todos que se aproximam e batalham contra um tipo de doença sem explicação.  
            
Essa família é composta por Paul, interpretado com a robustez de um pai rigoroso por Joel Edgerton, um homem que faz tudo por sua família, Sarah, interpretada por Carmen Ejogo, uma mãe que é carinhosa e cuidadosa, mas que se necessário consegue ser ainda mais rigorosa que seu marido e, por fim, Travis, interpretado com uma intensidade juvenil por Kevin Harrison Jr, um jovem que desconhece o mundo fora de sua casa, vive assombrado por seus sonhos, alguns intangíveis, outros tão reais que machucam. O longa inicia após a morte do pai da Sarah, que foi acometido pela misteriosa doença e faleceu. Sua figura adoecida é uma das imagens mais terríveis do filme, se não a mais terrível, com sua figura esguia, olhos completamente pretos e movimentos esdrúxulos.
            
A narrativa muda seu foco quando um homem chamado Willl, interpretado com um olhar dúbio por Christopher Abbot, tenta invadir a casa deles. Paul se identifica com a postura do homem quando diz que esteva fazendo tal ato por sua família. Dessa a forma, as duas famílias passam a conviver em conjunto na mesma casa. Nesse confinamento terrível, o diretor passeia pelos cômodos à noite, como se caminhasse por um labirinto. Criando uma atmosfera extremamente tensa, com pouquíssima iluminação, normalmente em locais específicos para que as sombras se projetassem nas paredes e ao redor dos personagens. O grande silêncio que preenche as cenas também ajuda, assim como a luz, a produzir o medo do desconhecido. Não podemos compreender o que acontece ao mundo, não podemos ver o que está ao nosso redor, não podemos sair daquela casa, não podemos escutar nenhum som, confinando o espectador numa espécie de paranoia coletiva.
            
Observando a sociedade contemporânea é possível perceber como esse filme funciona como atestado cultural da paranoia, principalmente americana, mas não só a deles, em relação os imigrantes. Sobre o que está para além do que seus olhos e ouvidos podem absorver. Veja bem, o único que tem um contato razoável com a família de Will é Travis, o jovem da família. Primeiro, por conta de sua enorme solidão, em segundo por conta de seu despertar sexual. Ele observa pelas paredes da casa o casal conversando e se diverte como um voyeur solitário, até começar a desejar sexualmente Kim, interpretada por Riley Keough.
            
Sendo assim, qualquer deslize da família “estrangeira” poderia ser crucial para os pais de Travis, pois no fim, não o conheciam. A desconfiança sempre é tamanha que não existe espaço para que se diga a verdade, a mentira se torna a única ferramenta de comunicação. Com isto, o desenrolar do enredo é lento, movimentando-se pelos enormes corredores casa, dia após dia, amordaçando o espectador com cuidado para que o medo se construa pelo que é impossível de se perceber. Assim, até alguns objetos substituem o real objeto do medo, como por exemplo, a porta vermelha que separa os recintos que os personagens realmente usam com a frente da casa.
            
Esse é apenas o segundo filme de Trey Edwards Shultz, trabalhando as conturbadas relações familiares em um único local, observando de perto as alterações psicológicas de seus personagens (tanto Krisha quanto em Ao Cair da Noite, por mais que um seja um melodrama e o outro um terror). Fazendo um filme de terror, que não propõe ao susto, mas a um medo do desconhecido bem elaborado. A imagem que fica no fim é a do cachorro da família latindo para o vazio da floresta.

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