Em sua estreia, Farhadi, traz os paradigmas da moral de
seu país. O tema que irá abordar em todos os seus filmes, se é possível chamar
algo tão intricado a produção de cinema, como a condição social iraniana, de
tema, talvez poderíamos chamá-lo de ponto de partida. Ao mesmo tempo que é possível ver o diretor
usando recursos que comumente são considerados televisivos, mas que, talvez,
fosse melhor chamá-los de datados e piegas. Com isto, narra a história de Nazar
jovem que tem de acabar o seu casamento após descobrirem que sua mãe era uma
prostitua.
A relação desse casal ingênuo se destrói por conta de
valores morais rígidos demais, muito bem trabalhados pelo cinema iraniano que
desde Kiarostami vem enfrentando todas as formas de censura que seu país impõe.
O início do longa é belíssimo, em que o casal assiste a um filme indiano, no
qual uma mulher dança sobre o vidro por amor a um homem. Nazar questiona sua
esposa se ela faria o mesmo, os dois brincam e ele joga uma maçã nele que
desvia e essa acaba por quebrar o vidro da janela. Essa pequena introdução já
diz que um deles terá que pisar no vidro para provar o seu amor pelo outro e
este será Nazar.
Ao tentar buscar dinheiro para pagar o dote de sua
esposa, que seria o preço para terminar o relacionamento, acaba apenas entrando
numa jornada, não só de autodescoberta, mas de muito sofrimento. Ele pretende
fazer isso por amor, para não manchar o nome de sua esposa. Farhadi joga seu
enredo do caos urbano para o deserto, quando, ao fugir de policiais Nazar
adentra na van de Haji. Essa virada visual modifica completamente o rumo do
longa trazendo indagações pertinentes e interessantes ao seu personagem.
Diferente do habitual, seu personagem principal fala
demais, não para nenhum momento com sua prolixidade. Tendo Haji como o seu
companheiro, porém é um homem de difícil de diálogo. Assim, Nazar se vê em
diversos monólogos até chegar em momentos de silencio absoluto. Além disso, o
diretor faz questão de trazer pequenos momentos de ingenuidade do personagem,
principalmente em relação ao amor, já que a forma que ele enxerga o amor é
aquele pueril de tantos filmes de Bollywood.
A
transformação do personagem pelos dias no deserto, na imensidão desse vazio e
do silêncio, é extremamente bem realizada por seu ator Yousef Khodaparast. Em
primeiro momento seu sorriso solto, olhos apertados começam a sumir para um
rosto mais cansado, suas bochechas ficam murchas. Já Haji é um homem da
realidade, um homem que caça cobras e pela sua mudez parece ter algo guardado
de muito pesado. Esse jeito infantil de seu protagonista aliado de um
personagem mais velhos e possivelmente sábio é um prato cheio para um movimento
cinematográfico iraniano que se inspira amplamente no Neorrealismo Italiano.
Ainda,
o diretor utiliza da metáfora da maçã e da cobra, que fazem parte do imaginário
religioso. Os dois símbolos são referenciados como o mal, mas também como o
conhecimento. Farhadi talvez esteja desde sempre apostando nisso, infringir o
suposto bem proposto pela moral, para obter algum tipo de conhecimento, algo que
seja mais que revelador, algo que seja real.
Porém,
existem opções técnicas do diretor que acabam por perder a força em seu drama.
Seja pelo o uso de câmera lenta pouquíssimo efetivo, tentando por meio desta
transforma uma cena mais intensa ou ainda os gritos de Nazar que ecoam tentando
de forma piegas reverberar sua dor pelo som do longa. É possível dizer que o
diretor trouxe consigo alguns recursos habituais da televisão iraniana, já que
trabalhava até então com séries de televisão. Estes recursos que foram ruins
não enfraquecem o longa como um todo. Que com pequenos gestos e símbolos conseguem
produzir uma reflexão acerca da cultura iraniana.
Por
fim, este é um drama competente de um diretor fenomenal. Sua estética, cada vez
mais restrita aos espaços urbanos apertados, ainda se encontrava em construção.
Mas seu ponto de partida em demonstrar o conhecimento a partir da quebra da
moral aparece de maneira contundente. A história de Nazar é uma história de
descobrir o amor e o próprio Irã.
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