sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

2017 – IT (Andy Muschietti, EUA) **** (4.0)

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Essa nova adaptação de um dos livros mais icônicos da literatura contemporânea do Terror, consegue ser ainda melhor que a sua adaptação anterior, não só porque acerta em conter apenas uma das duas narrativas principais, podendo assim se aprofundar de maneira mais intensa nesses personagens, além de criar um longa de terror mais visceral, e mesmo assim mais divertido. IT ou A Coisa, como é conhecido no Brasil, narra a história de crianças na cidade de Denver no Maine, em que formam uma união poderosa para enfrentar seus piores pesadelos.
            
A sequência inicial do longa é clássica. Uma criança pede ajuda ao seu irmão mais velho com o barco de papel para brincar nos pequenos córregos produzidos pelas chuvas. Seguindo seu barco rua abaixo, ele bate a cabeça e o seu barquinho cai num ralo. Eis que surge o pior pesadelo de todos, o palhaço Pennywise. Essa metáfora que existe no texto fonte é extremamente poderosa, este palhaço se transforma em qualquer coisa, ele assume a forma do medo de quem ele deseja literalmente comer. Assumindo a forma principal de uma criatura que é uma fobia para muitos, assim, Stephen King, como já comentou em seu livro “Sobre a Escrita”, assume o papel de escavador de ideias pré-existentes, quase uma incursão aos arquétipos do medo.
            
Aliás, essa sequência demonstra a habilidade de Bill Skarsgard, carregando o peso de uma atuação icônica de Tim Curry, em sua performance. Além de uma maquiagem extremamente elaborada, tornando sua fisionomia mais anormal, porém ao mesmo tempo, mais infantil, com os dentes estranhamentos expostos, quase como um coelho. Com seus olhos que alteram de cor e um terrível estrabismo que faz parecer que seus olhos são falsos. Sua voz, carrega uma falsa ingenuidade, um riso frouxo e perturbador.
            
Mas de fato quem rouba a cena dessa vez não é o palhaço, que está muito bem, porém, as crianças conseguem trazer muito mais afeição e até mesmo o riso. A escolha do elenco como um todo foi ótima. Bill, que tem seu irmão menor como desaparecido por conta da cena inicial, é interpretado por Jaeden Lieberher, conseguindo ser sensacional nas cenas de peso dramático, até porque seu personagem é o que carrega o maior peso emocional do longa. Além é claro de emular a gagueira muito bem, soando perfeitamente bem deste modo. Bill é como o líder do grupo de crianças, o famoso Loser’s Club que se consagrou nos anos 80. Em contrapartida, o grupo dos valentões existe no longa, mas seus momentos por mais que importantes e interessantes são levemente corridos.
            
Os três membros iniciais do Losers’s são Stanley, interpretado por Wyatt Oleff, o menos desenvolvido dos personagens. Imerso na cultura judaica, por mais que não a deseje com tanta intensidade, o personagem talvez seja o mais medroso do grupo, por isso o que mais denega o enfretamento da situação.  Eddie, interpretado com muita espontaneidade por Jack Dylan Grazier, é um jovem que é obrigado pela mãe à tomar medicamentos que funcionam como placebos, tornando toda e qualquer situação que o faz entrar em contato com algo possivelmente sujo, ou que lhe possa torná-lo doente, algo terrível. Este personagem, além de ser um dos mais engraçados, é também um dos que mais se desenvolve, já que sua jornada o faz desafiar a lógica dos pais. Riche, interpretado pelo ótimo e já bastante conhecido Finn Wolfhard, o piadista do grupo, resolve toda e qualquer situação com o riso. É fácil se identificar com o personagem que ri da desgraça alheia e sempre tenta ignorar à própria.
            
Mais três personagens, em decorrência dos desaparecimentos de crianças, se juntam a este grupo. Beverly, interpretada por Sophia Lillis, é uma jovem que sofre com o machismo perturbador de seu pai, diferente do filme anterior, sua postura não é de submissão, mas de completa resistência, além de ser a personagem que mais inspira os outros. Ben, interpretado com doçura por Jeremy Ray Taylor, um novato da escola que sofre bullying por estar acima do peso. Sua paixão por História e por Bev são alguns dos principais motores de formação de dinâmica de grupo. Mike, interpretado por Chosen Jacobs, é outro personagem que tem pouco tempo de tela em comparação com os outros, mas seus momentos são intensos já que sofre preconceito por ser negro.
            
Mas que jornada é esta na qual estes jovens passam? Talvez a jornada que anos 80 tentou contar em grande parte de seus longas marcantes. A do amadurecimento. Enfrentar seus próprios medos a partir do palhaço é o verdadeiro gesto narrativo deste longa. Superar a morte de seu irmão, é isso que Bill precisa fazer. Resistir contra o machismo e as dores de ser mulher nessa sociedade, é isso que precisa Beverly. Todos eles lutam uma batalha que é individual e universal.
            
Em questões técnicas, os efeitos especiais do longa estão impressionantes, tanto no que diz à maquiagem, como já citado na composição de Pennywise, mas também no CGI. O corpo do palhaço se deforma, se transforma na frente de nossos olhos e é de uma qualidade pouco vista no cinema de horror, que muitas vezes falha por ao mostrar demais e se tornar falso. Muschietti, não foi só bom em conduzir o seu filme com doses bem cadenciadas de comédia, drama e terror, mas por produzir momentos especiais como a montagem que brinca como Chaplin em Tempos Modernos, trazendo em sequência, primeiro, ovelhas enfileiradas para serem abatidas e depois as crianças enfileiradas na escola. Dando a entender a terrível situação de vida ou morte que elas estavam por vivenciar.
            
Bem, fazer uma comparação com o longa original chega a ser difícil. Apesar de no Brasil ter sido lançado como um longa de três horas, no qual contém tanto os momentos do grupo como criança, quanto como adulto. O filme de fato é uma minissérie de dois episódios para a TV. Isto é perceptível em seu ritmo episódico, do qual quase sofreu o longa novo. As grandes diferenças talvez sejam o foco da narrativa ter sido apenas nas crianças e a força que Bervely ganha, até pelo fato de no ano de 2017 algo avançou na perspectiva das mulheres no cinema, além disso, a violência deste longa que realmente produz um gore inesperado e intenso.
           
Por fim, é possível dizer que esse é um dos casos raros em que a nova versão de algo fica à altura do original, até melhor. É possível perceber que este longa é uma nova adaptação do livro que respeita à adaptação anterior. Com um elenco magnífico, que dá vida a estes personagens que são tão fáceis de se identificar e enfrentam um medo, o maior medo que é retratado pelos anos 80, o medo de crescer. 

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