
Essa
simples e amarga história consegue causar no espectador um dos gostos mais
doces possíveis. Não só pelo seu design de produção, reconstituindo diversos
momentos da vida do personagem, mas também pela sua comicidade
interessantíssima. Narrando a história do suicida, Ove, cansado da vida que
leva e já idoso, acaba por fazer uma inesperada amizade com seus novos
vizinhos.
Bem, o personagem reside numa
pequena rua fechada, na qual ele age como uma forma de patrulheiro. Colocando
ordem em tudo e todos. Seu modo de agir rabugento é extremamente bem elaborada
por Rolf Lassgard, que com um uso extremamente bem feito de maquiagem, encarna
os pesos da idade e de uma vida solitária. As tentativas de suicídio do
personagem durante todo o filme dão errado e quando está realizando-as acaba
por trazer memórias suas à tona. É nesse modelo que o filme se orienta, a
partir de flashbacks. Entretanto, a suave transposição entre o passado e o
presente acaba por não fragmentar a história, na verdade, dão um impulso maior
à narrativa. Veja bem, quando Ove se lembra de sua vida, de seu passado, falha
em se matar e por que falha? Bem, isso é compreendido pela própria doçura das
sequências apresentadas.
As sequências o mostram jovem, desde
antes de conhecer sua esposa, até a sua total paixão. A reconstituição de época
é bem elaborada, é possível se imergir no momento histórico, não só pelos trens
e ruas, mas pelas cores vivas também. Além disso, a fotografia sempre parece
mais ensolarada no passado, em contrapartida com o aspecto frio que permeia o
presente. É possível também compreender os motivos do qual o personagem é tão
obsessivo pela ordem, a única coisa que lhe sobraram quando sua mulher morreu.
Em certo ponto, o romance sensível dos dois lembra àquele apresentado em UP,
filme da Pixar, verdadeiro, singelo e necessário. Não é à toa que os dois
personagens com a morte de suas esposas tendem a se tornarem extremamente
rabugentos.
Mas não ache que o longa é uma
imersão pura na memória do personagem. Não mesmo. No presente, os novos
vizinhos começam a dar trabalho por não conhecerem as suas rigorosas regras,
porém ele acaba que por ajudá-los em diversos aspectos. É interessante denotar
que esses personagens são árabes, o que remete ao fenômeno da imigração dos
árabes à Europa. Algo que é bastante comum nos países nórdicos como Suécia,
Noruega e Finlândia, porém ainda assim não é bem visto por todos. Apresentá-los
como uma nova rede de apoio à solidão do personagem é como dizer que esses
países precisam abrir seus braços mesmo e deixarem de viver no isolamento
social, aquém ao que ocorre com o resto do mundo.
É interessante como o homem que é
apaixonado por carros como o protagonista deste longa, tem como território
subjetivo apenas a sua rua. Tão pequena, talvez até simplória, mas para ele com
um coração tão grande, essa rua bastava para que seu amor por carro fizesse
sentido. O desenrolar do longa e mais precisamente seu fim tornam-se bem
bonitos por conta desta forma que aos poucos vai-se quebrando a couraça
construída após a morte de sua mulher.
Um Homem Chamado Ove é um filme que
não é original, essa história pode ser vista diversas vezes no cinema, porém,
ela é atual e muito bem narrada. Com ótimas atuações, uma ambientação bem
realizada e um senso de humor que faz a risada surgir em momentos inesperados.
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