quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

1972 – O Poderoso Chefão (Francis Ford Coppola, EUA) ***** (5.0)

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É difícil escrever sobre uma obra que já foi tão bem avaliada por todos, esmiuçada de maneira tão poderosa e sempre redescoberta. Considerado como o maior filme de máfia americano, ou ainda, para alguns, o maior filme do mundo. Assisti-lo foi perceber o poder de toda uma eloquência dos atores, mas, principalmente, a genialidade de Coppola. Narrando a passagem de poder do patriarca da família Corleone para seu filho.  
            
Sem adentrar muito neste longuíssimo enredo é preciso fazer uma verdadeira análise de como os diálogos do filme são precisos. A maneira com que eles são ditos, suas pausas, seus silêncios, é realmente impressionante a habilidade rítmica do filme. Muito por conta das grandes atuações que habitam esse longa. Marlon Brando, como Don Vito Corleone, o famoso padrinho de todos, está verdadeiramente estupendo. Seus trejeitos, sua expressão facial (elaborada a partir de uma dentadura especial) e sua espontaneidade o fazem advir no papel. No momento que questiona “você vem à minha casa, bebe das minhas bebidas, come das minhas comidas, para me dizer isso? ”, ou ainda exclama sua frase mais marcante “Irei lhe fazer uma proposta que você não poderá recusar”, percebe-se a sabedoria do personagem em como lidar com as pessoas e, ainda mais, seus altos valores familiares, pois antes de chamá-lo de mafioso, ou de um homem de negócios, ele é o pai da família Corleone.  Al Pacino também é ótimo como Michael, seus olhos são o verdadeiro foco de toda sua atuação, olhos fortes e que conseguem dizer muito. Seu personagem faz de tudo para fugir das garras familiares, odiando o trabalho de seu pai, buscando uma vida fora do crime. No geral, o elenco realmente se inseriu em seus papéis, construindo um ambiente familiar e criminoso importantíssimo para toda a estética e até mesmo construindo uma cultura própria.
            
Mas, por mais que o roteiro pareça ser a parte mais elaborada de toda a composição do filme, muitos se enganam, pois existe todo um equilíbrio que corrobora para o resultado final desta obra. Existem diversos momentos que são passiveis de análise para uma grande direção, mas devo me ater a poucos para não me estender, ou ainda, não entregar algo importante que acabe com a experiência fílmica do espectador. Assim, A sequência inicial que dura mais ou menos trintas minutos, tem como objetivo principal apresentar os personagens em seu ambiente mais comum, em família. Com efeito, todos eles estão reunidos no casamento de Connie Corleone. Uma introdução simples para conhecer todas as tensões nas relações familiares e de negócios. A maneira com que Coppola passeia pelo ambiente, não só com o movimento de câmera, mas também por meio da montagem conseguem contrapor dois ambientes e sentimentos fortes, primeiro o gramado onde o casamento ocorre de fato, uma quantidade enorme de pessoas felizes, muitas delas bêbedas, com a forte luz do Sol iluminando a todos. Em contraste a isso, o escritório de Don Corleone, com seu tom expressionista, onde os rostos e as sombras se misturam, a luz é amarelada demais, bem saturada. Neste ambiente entende-se seu personagem, além de que se escutam histórias terríveis de como todos os seres são corruptíveis, além de ácidos comentários para aqueles que procuravam liberdade e felicidade no American Way of Life. Percebe-se, também, o potencial da fotografia do longa, como utiliza das sombras e dos ambientes fechados para produzir intensidade nas interações entre os personagens, além destes contrates.
            
Outro momento digno de certo comentário é o momento em que Michael está numa reunião especial dentro de um restaurante. Existe toda uma construção de tensão durante a cena, pois existiu uma elaboração prévia do resultado deste evento. Assim, Coppola, de maneira inteligente, monta toda a cena de forma imersiva, o espectador vivencia a experiência subjetiva de seu personagem. Os sons se modulam a partir da atenção do personagem, assim como o que se vê em tela está exclusivamente ligado ao que ele percebe. Portanto, a ansiedade do mesmo é expressa em cada corte e novamente, repito, os olhos de Al Pacino conduzem a cena, os close-ups em seus olhos são extremamente intensos, pois não demonstram só desespero, tensão, mas algo de ainda mais visceral que ajuda a realmente expressar o acúmulo de sentimentos presentes no evento. Para finalizar toda a sequência existe ainda a inserção de um som de um trem, que preenche o espaço sonoro de uma forma agoniante e ainda cria uma metáfora da inevitabilidade em curso, de um movimento sem fim. Seria possível ainda falar de outras cenas memoráveis, seja a cena do hospital que contém a mesma forma de tensão que esta e a cena do batismo, numa montagem poderosa e derradeira.
            
Por fim, devo dizer que O Poderoso Chefão é sim uma das obras-primas do cinema de toda história, é difícil dizer se é a melhor, ou não, talvez seja uma das mais completas com certeza. Seu afinco técnico e de enredo são inegavelmente surpreendentes, com suas três horas de duração consegue não só envolver o espectador experiencialmente por meio da direção, montagem, fotografia, trilha sonora, etc, como também consegue surpreender num enredo complexo e cheio de personagens. Sem em nenhum momento parecer exagerado ou forçando demais certas movimentações ou fluxos de narrativa, parece que tudo seguia um curso natural de tão bem apresentados que são os personagens.

Portanto, é um filme necessário para qualquer um que aprecie a arte. É uma obra necessária para se entender até mesmo o movimento a Nova Hollywood nos 70, a importância da classe dos malditos como Scorsese, Coppola e outros, para o ressurgimento do cinema americano. Resumindo há poucos como esse filme.

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