
É difícil escrever sobre uma
obra que já foi tão bem avaliada por todos, esmiuçada de maneira tão poderosa e
sempre redescoberta. Considerado como o maior filme de máfia americano, ou
ainda, para alguns, o maior filme do mundo. Assisti-lo foi perceber o poder de
toda uma eloquência dos atores, mas, principalmente, a genialidade de Coppola.
Narrando a passagem de poder do patriarca da família Corleone para seu filho.
Sem adentrar muito neste longuíssimo enredo é preciso
fazer uma verdadeira análise de como os diálogos do filme são precisos. A
maneira com que eles são ditos, suas pausas, seus silêncios, é realmente
impressionante a habilidade rítmica do filme. Muito por conta das grandes
atuações que habitam esse longa. Marlon Brando, como Don Vito Corleone, o
famoso padrinho de todos, está verdadeiramente estupendo. Seus trejeitos, sua
expressão facial (elaborada a partir de uma dentadura especial) e sua
espontaneidade o fazem advir no papel. No momento que questiona “você vem à minha
casa, bebe das minhas bebidas, come das minhas comidas, para me dizer isso? ”,
ou ainda exclama sua frase mais marcante “Irei lhe fazer uma proposta que você
não poderá recusar”, percebe-se a sabedoria do personagem em como lidar com as
pessoas e, ainda mais, seus altos valores familiares, pois antes de chamá-lo de
mafioso, ou de um homem de negócios, ele é o pai da família Corleone. Al Pacino também é ótimo como Michael, seus
olhos são o verdadeiro foco de toda sua atuação, olhos fortes e que conseguem
dizer muito. Seu personagem faz de tudo para fugir das garras familiares,
odiando o trabalho de seu pai, buscando uma vida fora do crime. No geral, o
elenco realmente se inseriu em seus papéis, construindo um ambiente familiar e
criminoso importantíssimo para toda a estética e até mesmo construindo uma
cultura própria.
Mas, por mais que o roteiro pareça ser a parte mais
elaborada de toda a composição do filme, muitos se enganam, pois existe todo um
equilíbrio que corrobora para o resultado final desta obra. Existem diversos
momentos que são passiveis de análise para uma grande direção, mas devo me ater
a poucos para não me estender, ou ainda, não entregar algo importante que acabe
com a experiência fílmica do espectador. Assim, A sequência inicial que dura
mais ou menos trintas minutos, tem como objetivo principal apresentar os
personagens em seu ambiente mais comum, em família. Com efeito, todos eles
estão reunidos no casamento de Connie Corleone. Uma introdução simples para
conhecer todas as tensões nas relações familiares e de negócios. A maneira com
que Coppola passeia pelo ambiente, não só com o movimento de câmera, mas também
por meio da montagem conseguem contrapor dois ambientes e sentimentos fortes,
primeiro o gramado onde o casamento ocorre de fato, uma quantidade enorme de
pessoas felizes, muitas delas bêbedas, com a forte luz do Sol iluminando a
todos. Em contraste a isso, o escritório de Don Corleone, com seu tom
expressionista, onde os rostos e as sombras se misturam, a luz é amarelada
demais, bem saturada. Neste ambiente entende-se seu personagem, além de que se
escutam histórias terríveis de como todos os seres são corruptíveis, além de ácidos
comentários para aqueles que procuravam liberdade e felicidade no American Way
of Life. Percebe-se, também, o potencial da fotografia do longa, como utiliza
das sombras e dos ambientes fechados para produzir intensidade nas interações
entre os personagens, além destes contrates.
Outro momento digno de certo comentário é o momento em
que Michael está numa reunião especial dentro de um restaurante. Existe toda
uma construção de tensão durante a cena, pois existiu uma elaboração prévia do
resultado deste evento. Assim, Coppola, de maneira inteligente, monta toda a
cena de forma imersiva, o espectador vivencia a experiência subjetiva de seu
personagem. Os sons se modulam a partir da atenção do personagem, assim como o
que se vê em tela está exclusivamente ligado ao que ele percebe. Portanto, a
ansiedade do mesmo é expressa em cada corte e novamente, repito, os olhos de Al
Pacino conduzem a cena, os close-ups em seus olhos são extremamente intensos,
pois não demonstram só desespero, tensão, mas algo de ainda mais visceral que
ajuda a realmente expressar o acúmulo de sentimentos presentes no evento. Para
finalizar toda a sequência existe ainda a inserção de um som de um trem, que
preenche o espaço sonoro de uma forma agoniante e ainda cria uma metáfora da
inevitabilidade em curso, de um movimento sem fim. Seria possível ainda falar
de outras cenas memoráveis, seja a cena do hospital que contém a mesma forma de
tensão que esta e a cena do batismo, numa montagem poderosa e derradeira.
Por fim, devo dizer que O Poderoso Chefão é sim uma das
obras-primas do cinema de toda história, é difícil dizer se é a melhor, ou não,
talvez seja uma das mais completas com certeza. Seu afinco técnico e de enredo
são inegavelmente surpreendentes, com suas três horas de duração consegue não
só envolver o espectador experiencialmente por meio da direção, montagem,
fotografia, trilha sonora, etc, como também consegue surpreender num enredo
complexo e cheio de personagens. Sem em nenhum momento parecer exagerado ou
forçando demais certas movimentações ou fluxos de narrativa, parece que tudo
seguia um curso natural de tão bem apresentados que são os personagens.
Portanto,
é um filme necessário para qualquer um que aprecie a arte. É uma obra
necessária para se entender até mesmo o movimento a Nova Hollywood nos 70, a
importância da classe dos malditos como Scorsese, Coppola e outros, para o
ressurgimento do cinema americano. Resumindo há poucos como esse filme.
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