quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

2015 – Tag (Sion Sono, Japão) **** (4.0)

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O que falar deste filme? É o primeiro longa que vejo do polêmico diretor Sion Sono, um diretor que se instala em certo gênero trash, porém que com maestria faz surgir o que há de melhor na potência imagética do cinema. Recheado de críticas sociais, por mais que ouse negá-las, Tag é uma incursão sobre o aprisionamento da mulher em um ideal virtual.
            
Obviamente esta proposta de tema se encontra em seu subtexto. O enredo é sobre Mitsuko, uma jovem estudante de uma escola só para meninas, numa região inóspita do Japão, que é perseguida por uma entidade bizarra, sem forma, algo como um vento cortante. Logo de início, ela percebe que parece estar presa em algum tipo de pesadelo, pois os eventos sempre voltam a acontecer, com leve diferenças. Para demonstrar a periculosidade da entidade o diretor nos apresenta uma cena emblemática, em que o vento corta ao meio todas as estudantes presentes no ônibus escolar, apenas sobrevivendo Mitsuko, já que a mesma havia abaixado para pegar um lápis.

Por mais que os efeitos sejam ruins, pelo uso do CGI quase escrachado, como se estivesse insinuando, a todo momento, a plasticidade do que se é visto, o gore e o terror é muito bem proporcionado pela fotografia e pela intensidade com qual usa da câmera. Em um dos momentos com suas amigas, Keiko, Izumi e Taeko, discutem sobre a possibilidade da existência de multi-universos e então elas brincam com os travesseiros, suas penas voam, se misturam com um tom vermelho. Quando está possibilidade se põe à mesa, toda a linearidade ou lógica do longa parece seguir por um caminho ainda mais absurdo. Mitsuko agora é interpretada por outras atrizes, vive outras vidas, tudo muda, a única coisa que permanece é o ímpeto de figuras simbólicas tentarem assassiná-la.

O símbolo das penas volta a se repetir como sinônimo de liberdade, como se fosse uma expressão de possibilidade da garota fugir deste ciclo vicioso em que sua morte é o principal desejo do universo. Nas outras versões de Mitsuko se encontram simbolismos que podem ajudar na sustentação de que a base do enredo se faz numa luta de sobrevivência feminina da protagonista. Em uma das narrativas que vive é obrigada a casar com um porco dentro de um caixão, já relacionando de diversas formas a obrigatoriedade do casamento para que a mulher possa ascender na sociedade, além do mais é algo como um ciclo vicioso também, não é mesmo? Aprofundando-se no desenrolar deste enredo que aparenta ser aleatório e sem estrutura, percebe-se uma tentativa de mostrar em diversas vidas da mesma mulher como ela está presa nesta lógica que a aprisiona. Não é à toa que não existe a presença de praticamente nenhum homem no longa.

Muito pode se argumentar sobre o local de fala deste diretor sobre o que uma mulher sofre, entretanto o que vejo aqui é uma especificidade que ele pode trabalhar, no qual é no próprio ideal de mulher japonesa, uma mulher virtual construída pelos homens. Sua narrativa é uma poderosa jornada para a busca de liberdade deste ideal, um plano simples, mas poderoso consegue mostrar essa proposta. Quando Mitsuko de alguma forma compreende o que está lhe acontecendo e ocorre a fusão de uma imagem sua e de uma pequena caverna, está caverna se posiciona em seu coração, logo ela entra por esta caverna, assim sendo, demonstrando a viagem de si que a personagem faz para destruir este ideal masculino.
            
A grande peculiaridade deste longa é saber usar destes signos de videogames japoneses, de mangás, da cultura pop e por vezes perversas que se espalham no Japão. O longa pode não ter um afinco técnico exemplar, porém isto impressionante não chega a prejudicar sua narrativa, já que seu mistério e agonia prendem o espectador. Para aqueles que se aventuram até o fim desta pequena pérola se surpreendem com o resultado final. Existe aqui a mesma loucura e comentário político sobre a sociedade japonesa que aquele visto nos anos 60, no movimento da Naberu Bagu.

Por fim, devo dizer que fiquei impressionando pela coragem do diretor de trazer um olhar tão próprio num tema já extremamente especifico, conseguindo ser divertido, assustador e poético em sua abordagem. 

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