
Em Hitchcock/Truffaut, os dois
grandes diretores discutem a possibilidade do “Run For Cover”, ou seja, após
alguns fracassos voltar à zona de conforto. É possível dizer que este filme do
diretor surgiu com um desejo de dar fim ao ciclo de Antoine Doinel, porém seu
apelo à nostalgia de uma forma pouco envolvente me faz refletir se não foi um
verdadeiro desejo de retornar ao que Truffaut já amou. Seu filme anterior, por
exemplo, O Quarto Verde, é sobre um homem que não consegue parar de viver do
passado dos outros. Este quinto e último segmento da história do insensato
Doinel, acontece quando ele resolve escrever um livro, que o faz relembrar de
suas aventuras e alguns novos acontecimentos o fazem incidir ainda mais sobre
seu passado.
É bem verdade que os filmes deste ciclo de Truffaut
permanecem com a vivacidade da Nouvelle Vague, talvez seja a neurose expressa
pelas mãos de Jean-Pierre Leaud, ou ainda sua verborragia, falando, falando sem
parar. Mas, de fato, existe um ritmo mais dinâmico, parece conter certas improvisações
que deixam as obras mais cotidianas. Com isto, após o fim do relacionamento de
Doinel e Christine, ele passa a se relacionar com Sabine, uma jovem vendedora
de discos. É engraçado como ele ainda se relaciona da mesma forma que antes,
como uma criança, cheia de peculiaridades, de maneirismos, de uma paixão tão
pueril e bonita. Esse seu personagem, carregado de doçura, por mais que em
certos momentos seja irritante, por erra sem parar, é uma forma do Truffaut
contar algo de sua história. Os Incompreendidos era claramente sobre ele, as
sequências com certeza foram tomando resoluções cartunescas, esse foi até mesmo
um dos motivos no qual o diretor resolveu encerrar o ciclo. Ele não se
enxergava mais naquele personagem, havia se tornado um personagem literário
demais. Entretanto, consegue expressar ainda neste filme tantas histórias do
diretor, Antoine Doinel é seu duplo completamente.
Inebriado pelo passado, servindo-se da sincronicidade
fílmica, o protagonista reencontra Collete, que se diverte ao ler sobre a visão
de Doinel sobre os momentos da adolescência dos mesmos. Neste momento, ele
titubeia, tropeça, pois se depara com a concretude do que um dia disse ser o
melhor momento de sua vida, é quando o nostálgico deixa de ser memória e toca a
pessoa com as próprias mãos. Neste momento, infelizmente, o diretor utiliza da
narração cômica de Colette e reproduz os momentos dos filmes anteriores. O
filme é recheado dessas inserções, que levam mais tempo do que deveriam. O
problema não é falar da nostalgia, isso nunca será um problema se bem narrado, o
filme se complica quando repete o que já foi exibido dos filmes anteriores para
recorrer a um sentimentalismo nostálgico forçado. Esta opção estética do
diretor acaba por ser um pouco irritante, contudo, sua narração é tão singela,
a maneira que, por pequenos detalhes, vai construindo essa nova relação de
Doinel e Sabine, por mais que em certos momentos se assemelhe e muito à relação
com Christine, mas bem se sabe que o Doinel está trilhando um caminho a repetir
seus erros.
Seus momentos finais demonstram um pouco da escolha que o
diretor fez ao encerrar este ciclo, um belo momento, na qual explica o porquê
de seu protagonista ter se apaixonado por Sabine, é onde Doinel encontra forças
para seguir em frente, tentar deixa de carregar o passado como um destino e
passar a olhar para frente, para um futuro, para algo diferente.
Amor em Fuga é singelo, perde um pouco o ritmo com a
nostalgia engessada, porém não deixa de ser divertido e açucarado como qualquer
um dos filmes deste ciclo, com um amargor aqui e ali.
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