sábado, 9 de dezembro de 2017

1979 – O Amor em Fuga (François Truffaut, França) **** (4.0)

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Em Hitchcock/Truffaut, os dois grandes diretores discutem a possibilidade do “Run For Cover”, ou seja, após alguns fracassos voltar à zona de conforto. É possível dizer que este filme do diretor surgiu com um desejo de dar fim ao ciclo de Antoine Doinel, porém seu apelo à nostalgia de uma forma pouco envolvente me faz refletir se não foi um verdadeiro desejo de retornar ao que Truffaut já amou. Seu filme anterior, por exemplo, O Quarto Verde, é sobre um homem que não consegue parar de viver do passado dos outros. Este quinto e último segmento da história do insensato Doinel, acontece quando ele resolve escrever um livro, que o faz relembrar de suas aventuras e alguns novos acontecimentos o fazem incidir ainda mais sobre seu passado.
            
É bem verdade que os filmes deste ciclo de Truffaut permanecem com a vivacidade da Nouvelle Vague, talvez seja a neurose expressa pelas mãos de Jean-Pierre Leaud, ou ainda sua verborragia, falando, falando sem parar. Mas, de fato, existe um ritmo mais dinâmico, parece conter certas improvisações que deixam as obras mais cotidianas. Com isto, após o fim do relacionamento de Doinel e Christine, ele passa a se relacionar com Sabine, uma jovem vendedora de discos. É engraçado como ele ainda se relaciona da mesma forma que antes, como uma criança, cheia de peculiaridades, de maneirismos, de uma paixão tão pueril e bonita. Esse seu personagem, carregado de doçura, por mais que em certos momentos seja irritante, por erra sem parar, é uma forma do Truffaut contar algo de sua história. Os Incompreendidos era claramente sobre ele, as sequências com certeza foram tomando resoluções cartunescas, esse foi até mesmo um dos motivos no qual o diretor resolveu encerrar o ciclo. Ele não se enxergava mais naquele personagem, havia se tornado um personagem literário demais. Entretanto, consegue expressar ainda neste filme tantas histórias do diretor, Antoine Doinel é seu duplo completamente.
            
Inebriado pelo passado, servindo-se da sincronicidade fílmica, o protagonista reencontra Collete, que se diverte ao ler sobre a visão de Doinel sobre os momentos da adolescência dos mesmos. Neste momento, ele titubeia, tropeça, pois se depara com a concretude do que um dia disse ser o melhor momento de sua vida, é quando o nostálgico deixa de ser memória e toca a pessoa com as próprias mãos. Neste momento, infelizmente, o diretor utiliza da narração cômica de Colette e reproduz os momentos dos filmes anteriores. O filme é recheado dessas inserções, que levam mais tempo do que deveriam. O problema não é falar da nostalgia, isso nunca será um problema se bem narrado, o filme se complica quando repete o que já foi exibido dos filmes anteriores para recorrer a um sentimentalismo nostálgico forçado. Esta opção estética do diretor acaba por ser um pouco irritante, contudo, sua narração é tão singela, a maneira que, por pequenos detalhes, vai construindo essa nova relação de Doinel e Sabine, por mais que em certos momentos se assemelhe e muito à relação com Christine, mas bem se sabe que o Doinel está trilhando um caminho a repetir seus erros.
            
Seus momentos finais demonstram um pouco da escolha que o diretor fez ao encerrar este ciclo, um belo momento, na qual explica o porquê de seu protagonista ter se apaixonado por Sabine, é onde Doinel encontra forças para seguir em frente, tentar deixa de carregar o passado como um destino e passar a olhar para frente, para um futuro, para algo diferente.
            
Amor em Fuga é singelo, perde um pouco o ritmo com a nostalgia engessada, porém não deixa de ser divertido e açucarado como qualquer um dos filmes deste ciclo, com um amargor aqui e ali. 

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