sábado, 30 de dezembro de 2017

2017 – Em Ritmo de Fuga (Egdar Wright, EUA & Inglaterra) ****1/2 (4.5)

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Edgar Wright vem se firmando como um dos diretores com um senso estético mais próprio no cinema dito comercial, além de construir comédia e ritmo por meio de montagem de maneira preciosa. Este filme foge de seu estilo propriamente mais cômico, porém introduz de maneira mais aberta o seu enredo, contendo espaço para diversos momentos de ação, romance, drama e comédia. Seu enredo é sobre um jovem chamado Baby que trabalha como piloto de fuga para pagar uma dívida.
            
Já devo ter dito em alguma outra crítica como a história do cinema de ação se encontra com o seu pé inicial no cinema burlesco, aquele de Chaplin, Keaton, Lloyd, assim como o musical. Claro, que os dois sofrem influências bem diferentes, porém contém certos princípios de produção que se assemelham, principalmente o ritmo. Por isto, é genial como o diretor por meio da montagem e de um trabalho de mixagem de som primoroso, consegue fazer misturar tanto as ações dos personagens, quanto sons cotidianos à trilha sonora, que em grande parte do tempo, senão todo, se passam nos fones de ouvido do protagonista do filme. Além disso, por serem músicas escolhidas pelo próprio personagem para tocarem em determinados momentos, elas conseguem conter um significado ainda mais poderoso para a narrativa. Pode-se ver isso na cena inicial, na qual Baby espera os seus companheiros de crime assaltarem o banco para realizar a fuga, todo o assalto é substituído pelo protagonista dançando dentro do carro, ao ritmo da música e com a velocidade da montagem, consegue trazer o espectador de volta à ação, para partir em direção à fuga/perseguição. A maneira com que a câmera se movimenta em cenas comuns são muito musicadas, até mesmo uma cena em que o Baby dança pelas ruas, existe um ritmo inserido, algo completamente advindo dos clichês dos musicais.
            
O visual estético é realizado por uma paleta de cores viva, ao mesmo tempo que se distribui de maneira simples, contudo poderosa por seus personagens, como o verde para o chefe, Doc, ou o Bats que exala vermelho em sua jaqueta, cada cor com um significado presente, além de organizar visualmente as cenas. A vida de Baby se torna complicada quando se apaixona por Debora, uma garçonete que trabalha na mesma lanchonete que um dia sua mãe trabalhou, ouvindo seu canto e seu gosto por música, logo se apaixona de forma pueril. Ansel Egort que interpreta o protagonista consegue encarnar de maneira precisa o jovem que está consciente de suas ações, porém percebe-se em seu rosto o quanto é levado por certa ingenuidade romântica. Já Debora, interpretada com tamanha leveza por Lily James, contém um charme nostálgico, não é à toa que o relacionamento deles é tão mágico e angelical que lembra um amor dos anos 50. O momento em que os dois se encontram na lavanderia, sendo possível ver as roupas girarem nas máquinas, cada uma com uma cor diferente, criando o aspecto de movimento de mundo que existe no musical, além de usar deste ritmo para fazer uma sobreposição para um disco de vinil. Percebe-se aí como as imagens do diretor dizem bastante sobre os personagens, sobre o enredo, ela pode ser intensa, urgente e por vezes veloz, mas é sempre com um ritmo que introduz sentido.
            
Falando mais separadamente de cada personagem. Baby é um personagem que está sobre puro domínio do filme, ele tem um problema no ouvido por conta de um acidente que sofreu, por isso, o tempo todo está com os fones de ouvido, dessa forma, ele usa disto para gravar sons cotidianos e misturar com batidas para, então, criar certas músicas, muitas delas cômicas. Assim, percebe-se como o mundo construído pelas imagens deste filme contém uma parcela da subjetividade de seu personagem principal, pela maneira com que tudo tem ritmo e é passível de ser musicado. É bonito ver também que quem cuida deste personagem é um senhor bem idoso que é surdo e mudo, como se fossem feitos um para ajudar ao outro.

Os outros personagens mais importantes fazem parte da equipe de assalto, entre eles o Doc, interpretado de maneira rígida por Kevin Spacey, sem espaços para muitos devaneios, seu personagem sempre estar por chantagear, ao mesmo tempo que protege seu piloto de fuga, em alguns momentos é possível ver notoriamente uma relação quase que paterna. É ele quem orienta e organiza todos os roubos, de maneira extremamente detalhada. O casal Buddy, interpretado por John Hamm, e Darling, interpretada por Eiza González, suas cores são azuis e lilás respectivamente, são como o Bonnie & Clyde, que vivem dentro do crime por uma certa excitação, uma paixão enlouquecida. Os dois atores se encontram em total harmonia, o John Hamm consegue partir de um homem compreensivo para um psicopata de maneira exemplar. Por fim, o Jaime Foxx, interpretando Batts, fazendo o papel de um homem que quer provar a Baby que ele não foi feito para o mundo do crime, a todo momento seu desejo é o de mostrar o que há de pior em todos os sujeitos, sua cor é vermelha, não à toa. Sua atuação está exemplar, completamente imprevisível.
            
A imprevisibilidade dos personagens ajuda ao filme a construir suspense, algo que já era comum ao diretor pela comédia, mas aqui o ajuda ainda mais na sensação de urgência e tensão que alguns personagens conseguem causar, tanto para o bem quanto para o mal. Se é possível dizer que esta história de Baby já foi contada diversas vezes, realmente foi, mais recentemente Nicolas Winding Refn produziu Drive, mas a maneira com que foi contada aqui é completamente própria de Edgar Wright, sua montagem, sua estética como um todo pulsa um cinema poderoso que mistura de maneira equilibrada diversos gêneros.
           
Portanto, Em Ritmo de Fuga (o título original Baby Driver seria realmente difícil de levar a sério traduzido de forma literal) é um verdadeiro musical de ação cômico, que ainda tem poder para o drama e a tensão. Com um senso estético primoroso e um ritmo inestimável que é de certo o alicerce deste longa.

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