quinta-feira, 21 de dezembro de 2017

2016 – É Apenas o Fim do Mundo (Xavier Dolan, Canadá) **** (4.0)

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Vaiado no Festival de Cannes, É Apenas o Fim do Mundo segue até certo ponto o mesmo padrão estético de Dolan, porém utilizando do recurso do close-up de maneira exuberante. Acusado de teatralidade, o filme se torna completamente cinematográfico pela conjunção da saturação da fotografia, pelo uso da montagem capturando detalhes só possíveis de servirem como experiência no cinema. Narrando o retorno de Louis, jovem escritor, para casa depois de anos fora.
            
Os atores foram escolhidos de maneira meticulosa, Gaspard Ulliel como Louis, conseguiu transmitir a angustia do retorno, a impossibilidade de falar de sua vida com medo do preconceito, é como se todas as suas palavras estivessem desmanchadas e espelhadas pelos mínimos movimento de seu corpo, principalmente ao engolir a saliva. Nathalie Baye, interpreta sua mãe, como todas as mães de Dolan, fala pelos cotovelos, tenta se fazer presente de forma flamboyant, exagerada, mas sempre sensível. Léa Seydoux interpreta sua irmã Suzanne, que por mais que tenha o visual mais rebelde, dos três filhos é aquela que de fato é a mais dominada pela mãe, não conseguindo sair de casa, enxergando seu irmão Loius com certo idealismo. Por fim, mas não menos importante neste elenco, Vincent Cassel como Antoine, o irmão mais velho, sempre estressado, com certa inveja de seu irmão e Marion Cotillard como Catherine, sua esposa, afável, porém submissa, sua voz parece sempre fraquejar. Estes são os únicos atores de toda a trama, pois tudo ocorre dentro da casa deles, além de algumas poucas aqui e ali nos arredores. Dolan não deixa nenhum deles fugir de seu enquadramento, baseando seu roteiro numa peça de mesmo nome, os personagens ganham texturas ainda maiores já que são o elemento chave do desenvolvimento de toda a narrativa.
            
Porém, por mais que haja uma teatralidade na prolixidade de seus personagens, ou ainda certa indulgencia pela quantidade de vezes que eles se insultam, se interrompem, brigam, a narrativa permanece sempre poderosa. Existem certos diálogos simples que por conta de um pequeno silêncio, ou ainda de um close-up vão se tornando mais afetantes.  A fotografia fria corrobora para a sensação de incerteza e angustia na qual Louis passa ao chegar em casa, tudo permanece entalado na garganta. Os planos longos também ajudam seus atores a até mesmo comporem melhor seus personagens, ou ainda intensificam os momentos de silêncio. Os close-ups servem para que os atores conseguiam demonstrar suas emoções por meio de micro expressões, pois a angustia reverbera em cada um de maneira diferente. Se Antoine sempre grita e se movimenta, Catherine olha para baixo, move os lábios levemente. Além disso, a montagem estende pequenos momentos, como um olhar e um abraço, para intensifica-los.
            
Com o passar das brigas e dificuldades, esse acúmulo de dor e agonia começa a se expressar de maneira generalizada pelo suor dos personagens e o surgimento de Sol de forma completamente surreal no cenário. Toda a fotografia fria aos poucos se torna uma explosão de luz amarelada. E este fluído corporal, o suor, passa a ser liberado sem parar, com a forma dos close-ups e dos planos detalhes, é possível vê-lo brilhar na pele, escorrer pelo pescoço, o próprio sentimento destes personagens escorre por entre os dedos deles. Por fim, este fluído se mistura com as lágrimas e com a chuva que chega, tudo se torna um só, um só sentimento.
            
Este trabalho minucioso e de difícil proposição é um verdadeiro feito para o diretor, que, por mais que torne em certo ponto de seu filme os diálogos enfadonhos, os faz dessa forma por uma real necessidade narrativa, além, de é claro, mudar a forma de seu filme para alcançar uma experiência de catarse mais intensa. A utilização destes close-ups serve de maneira de capturar a expressão dos personagens tanto quanto a razão de aspecto reduzida em Mommy, seu filme anterior. Utilizando da catarse cinematográfica. Pois ao observar o mínimo movimento consegue trazer uma potência maior da sutileza existente no exagero dos diálogos, veja só o suor, líquido que se movimenta pelos corpos, ou ainda o aumento da razão de aspecto em Mommy.
            
Se este longa foi vaiado e por muito odiado é pelo simples fato dele realmente se tornar em algum momento irritante, talvez até repetitivo, porém é uma sensação necessária para a impressionante catarse. Porém, não uso esses adjetivos de forma ruim, “irritante” ou “repetitivo”, são apenas características que compõe este longa. Em nenhum momento ele é mal realizado, mal interpretado, tudo é feito com deveras maestria.
            
Portanto, É Apenas o Fim do Mundo faz jus ao seu título criando um Apocalipse microcósmico dentro da lógica de uma família completamente desregulada, porém carregada de afeto. Com atuações impressionantes, Xavier Dolan mostra uma direção segura, diferente e poderosa, buscando a todo momento fazer o espectador se angustiar com a intensidade desta família, a intensidade que se expressa, contudo que Louis não consegue dizer. 

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